Pobre Maria do Céu, uma fada “aposentada” que volta à terra, no mundo atual, descobre que as pessoas não usam mais a imaginação porque foram inundadas pelo consumismo. E até que "os pequeninos", de coração puro, não conseguiam detectar uma fada e a sua capacidade de realizar todos os seus desejos.
“ Pensou e viu que só se pode ser fada na Terra.
Ser idéia no céu não adianta nada.
É como ser homem sem corpo na Terra."
O que seria do mundo sem imaginação? Para algumas pessoas essa indagação é desnecessária, elas nem sabem o que é imaginação, e muito menos como e onde ela está, e pode ser usada. O livro Onde tem fada, tem bruxa vem nos mostrar exatamente isso.
“Ela foi para o azul
Fez nuvem com seu vestido,
colou sua estrela perto das que lá brilhavam.
Seu chapéu, ela deu de presente para menino que por ali passeava... (só em
sonho) E virou idéia. Isso faz tantos anos!..."
A linguagem que hoje permeia o mundo infantil nada mais é do que uma indução ao consumismo. Basta olharmos para as vitrines: sapatos, roupas, internet e a alimentação das crianças; são cópias fiéis dos itens essências dos adultos. Não estamos distantes da sentença de que as crianças são adultos em miniatura. Na obra podemos ver a premissa de que as crianças são induzidas ao consumismo e carregam a transformação de valores impostos pelo universo adulto, dessa forma, é prova de fogo despertar o interesse das crianças, já que há milhares de atrativos que distorcem sua atenção e impedem de vivenciar e explorar o colorido e abundante mundo infantil que deveria permeá-los - cheio de simplicidade e encanto. “Onde tem fada tem Bruxa” mostra que é possível atravessar a densa camada de barreiras entre os dois mundos (adulto e infantil). Dessa forma o autor demonstra que a criança também tem o livre arbítrio de se pronunciar diante dos seus desejos e que eles são plausíveis.
Além da protagonista, podemos ver outros personagens emblemáticos na obra: os mágicos, espécies de bruxos e bruxas (pessoas adultas que não mais conseguiam sonhar, fantasiar) trocam seus sonhos, desejos e fantasias por coisas materiais, palpáveis; os meninos: vivem submissos aos poderes e universo dos adultos, onde seus sonhos estão soterrados por uma opinião de valores sociais ditados pela sociedade.
A obra faz uma crítica ao consumismo. Há um momento na narrativa em que a fada, sem nada para fazer, apenas fica observando a cidade e, por meio de sua observação, as crianças vão mostrando o seus desejos, ainda que de forma tímida e reprimida, por estarem moldadas pelo sistema capitalista. Ainda assim, regido pelo adulto, este impedia os pequenos de viverem plenamente com liberdade, observe este trecho:
Os meninos calaram...
Com gesto preciso, fez surgir, no centro da praça, uma cama de madeira
polida e mais um colchão de algodão macio.
- É sua-disse a fada.
A menina, olhando de longe e com medo daquela verdade, respondeu:
- Não quero mais. Não tenho casa para guardar a cama.
A fada, sem vacilar, continuou seu trabalho, fazendo nascer, nomeio da
praça, uma casa, com janelas para os quatro cantos do mundo! E dentro da
casa, a cama.
A alegria engoliu os meninos, que dançavam roda em volta da casa, olhavam
pelas janelas, subiam no telhado, fingiam sono sobre a cama.”
É sua-disse a fada.
A menina, olhando de longe e com medo daquela verdade, respondeu:
Não quero mais. Não tenho casa para guardar a cama.
A fada, sem vacilar, continuou seu trabalho, fazendo nascer, nomeio da praça, uma casa, com janelas para os quatro cantos do mundo! E dentro da casa, a cama.
A alegria engoliu os meninos, que dançavam roda em volta da casa, olhavam pelas janelas, subiam no telhado, fingiam sono sobre a cama.”
Diálogo entre o autor e a obra : Bartolomeu Campos de Queirós e “Onde tem Bruxa tem fada”.
O autor acredita que por meio da fantasia a criança explica o mundo que a cerca, no entanto, em inúmeras vezes isso gera complicação, já que muitas vezes isso se torna um empecilho para elas, devido aos limites existentes no seu cotidiano.
Bartolomeu sensibiliza o mundo infantil em sua obra, dando poder à imagens a fim de descobrir mistérios ocultos em que a imaginação e fantasia são seus alvos. Para ele a imaginação e fantasia são primordiais, bem como a poesia presente em seus livros, desperta a leitura de um leitor que precisa de uma linguagem rica para poder descobrir o que há por trás do texto literário. A obra do escritor é detentora de uma grande ludicidade, capaz de envolver seu leitor. As crianças, acostumadas a viver em um mundo controlado , nem sabem mais identificar seus desejos. Dessa forma, infere-se, que o texto seja uma crítica levemente ácida ao mundo moderno, mas mostra também que nos sonhos as crianças sabem que a fantasia é altamente necessária, que o encantamento deve e pode estar vivo, assim como o autor reconhece.
A vez do autor
"Nascido em Pará de Minas, Minas Gerais, em 1944, Bartolomeu Campos Queirós é autor de vários livros para crianças, de peças teatrais e textos sobre arte-educação. Teve o seu primeiro livro, OPeixe e o Pássaro, publicado em 1971. Depois vieram Pedro, OndeTem Bruxa Tem Fada, Faca Afiada, Ciganos, Flora, Indez, Correspondência, Cavaleiros das Sete Luas, Por Parte de Pai, entre outros. Recebeu os mais significativos prêmios no Brasil pelo seu trabalho literário: Selo de Ouro da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil, Prêmio Bienal Internacional de São Paulo, Prêmio Prefeitura de Belo Horizonte, O melhor para Jovem, Prêmio Jabuti daCâmara Brasileira do Livro, Grande Prêmio da APCA — Associação Paulista dos Críticos de Arte, Prêmio Orígenes Lessa — Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil, Diploma de Honra do IBBY, Quatrième Octogonal — França, Rosa Blanca de Cuba, Bienal deBelo Horizonte.Bem-humorado, apreciador do silêncio, Bartolomeu costuma dizer: 'Sou frágil o suficiente para uma palavra me machucar,como sou forte o bastante para uma palavra me ressuscitar'."
Confira também a entrevista com Bartolomeu Campos Queirós acessando o link http://migre.me/6csA1
Confira também a entrevista com Bartolomeu Campos Queirós acessando o link http://migre.me/6csA1
Referências:
DUTRA, Leidenaide SILVA, Vaneide Lima, A prosa poética de Bartolomeu Campos de Queirós : leitura de Onde tem bruxa tem fada.Coordenação de Pesquisa e Extensão – COOPEX , 2010.
QUEIRÓS, Bartolomeu Campos. Onde tem bruxa tem fada... São Paulo: Moderna, 2002
MICHELLI, Regina Silva, A fada: presença na literatura infanto-juvenil brasileira
contemporânea, Rio de Janeiro.
contemporânea, Rio de Janeiro.
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