quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Os dois aspectos da ilustração na Literatura Infantojuvenil indígena

 
As narrativas indígenas têm como umas das principais características a ilustração. Sua importância decorre de dois aspectos: a preservação da cultura indígena e tornar a leitura mais didática. No primeiro, normalmente, os desenhos são coloridos e feitos pelos próprios índios. Para eles, a ilustração é tão importante quanto a própria narrativa; é a narrativa. São utilizadas para representarem a cultura indígena.
 
Livros que não são escritos por índios costumam apresentar falha ao focar apenas na narrativa, alguns se esquecem da ilustração e acabam não representando a cultura com fidelidade.
 
A literatura indígena ainda está muito ligada à tradição oral. Os escritores, indígenas ou não, desejam representar suas tradicionais canções, narrativas orais por meio da literatura escrita, em suas línguas de origem ou pela própria língua portuguesa. A leitura de textos indígenas, principalmente de autoria indígena, deve ser orientada pelo contexto da oralidade. O leitor deve colocar-se como ouvinte, tornando a leitura mais dinâmica e prazerosa. Como exemplo dessas ilustrações a imagem a seguir:
 
 “Você está preparado para conhecer a história de Myrakãwéra? Yaguarê Yamã reúne a lenda dos parintins e dos maraguás, povos indígenas do Amazonas, para contar as incríveis aventuras dos curumins Ãgnáw e Ãgapany na região amaldiçoada de Myrakãwéra. Ninguém está a salvo dos temidos mortos-vivos e das formigas gigantes que aterrorizam o lugar!" (Yaguarê Yamã, disponível em: http://yaguareh.blogspot.com.br/)
 
Por outro lado, a ilustração tem a função de tornar a leitura do texto mais didática. Segundo SIMM; BONIN (2011), geralmente as imagens construídas dos índios são facilmente reconhecidas como tal, figuras esteriotipadas – cabelo preto, tanga, pele morena, rosto com pintura, cocar etc. Essa simplificação é explicada pela provável dificuldade enfrentada pelos leitores – jovens e crianças – com imagens mais complexas que necessitam de um conhecimento prévio para serem interpretadas. “[...] ao naturalizarmos as características de um sujeito em geral somos impelidos a atribuir estas mesmas características a todos os que identificamos como seus pares – a expressão coloquial ‘viu um índio, viu todos’, se aplica muito bem a esta simplificação.” (SIMM; BONIN, 2011, p. 90).
 
A seguir um exemplo de ilustração com essa função, ilustração de Inez Martins:

 
 

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Fonte:

Anais do SILEL, v. 2, n. 2. Uberlândia: EDUFU, 2011. Disponível:

Mitos indígenas: a mulher que vira beija-flor


Os índios trazem consigo diversas histórias com mitos, que para eles, confundem-se com a realidade. Por muito tempo toda essa tradição era passada boca a boca pelos pajés e entre os demais indígenas da tribo. Hoje, eles têm a oportunidade de escrevê-las em livros. É o caso da comovente história de “A mulher que virou beija-flor para libertar sua filhinha”, em que Coaciaba, uma bela e jovem índia, ao perder o marido guerreiro, desfalece de saudades deixando sozinha a pequena filha do casal, que também não resistindo de tristeza, pede aos espíritos que a levem para junto da mãe e acaba morrendo, tornando-se uma linda flor lilás.  Os índios trazem consigo diversas histórias com mitos, que para eles, confundem-se com a realidade. Por muito tempo toda essa tradição era passada boca a boca pelos pajés e entre os demais indígenas da tribo. Hoje, eles têm a oportunidade de escrevê-las em livros. É o caso da comovente história de “A mulher que virou beija-flor para libertar sua filhinha”, relatada por Leonardo Boff (apud BORTOLIN, 2004). Nesta história, Coaciaba, uma bela e jovem índia, ao perder o marido guerreiro, desfalece de saudades deixando sozinha a pequena filha do casal, que também não resistindo de tristeza, pede aos espíritos que a levem para junto da mãe e acaba morrendo, tornando-se uma linda flor lilás.



A mãe fora, antes transformada em borboleta, um dia pousou na flor lilás e,  ouvindo lá dentro um choro, reconhece a voz da filha e tenta libertá-la. Não conseguindo, apela aos espíritos para ser transformada em beija-flor. Ao ser atendida, liberta a filha e ambas voam juntas, felizes até o céu.
 
Pode-se então notar nesse pequeno conto, os mitos que os indígenas ainda levam, de acreditar que os espíritos podem transformar os mortos em animais ou outros seres. Algumas tribos, ao enterrarem uma criança órfã, cobrem-na com flores lilás para que a mãe possa vir buscá-la. Esse conto torna-se de fácil compreensão por ter como tema o amor, que é universal. No entanto não é sempre assim. Apesar de os mitos serem expressões populares que estão presentes na sociedade, de um modo geral, os mitos indígenas são de mais difícil compreensão, uma vez que não conhecemos bem a cultura e valores desse povo. Para um melhor entendimento, em alguns casos, é necessário entrar em contato, estudar um pouco a cultura para perceber a riqueza de suas significações. Assim, além dos cantos, diálogos cerimoniais e outros discursos, os mitos fazem parte da forma de expressão oral dos indígenas e, alguns, como “A mulher que virou beija-flor para libertar sua filhinha”, foram escritos e publicados, apresentando a cultura indígena.



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Fonte:
 
BORTOLIN, Suely. A presença do indígena na literatura infanto-juvenil brasileira. Outubro de 2004. Disponível em:


O índio "bom selvagem" na Literatura Infantojuvenil 2

     A imagem do índio nacional como bom selvagem representada hoje nos livros infanto-juvenil tem sua origem desde os primeiros relatos sobre os índios feitos pelos europeus no Brasil. Chamava atenção dos portugueses uma cultura diferente da europeia, homens desprovidos de leis, religião e que tinham na vida em comunidade sua sustentação, sem sentimentos de cobiça. Desde o primeiro documento escrito no Brasil ,essa imagem está imposta, como podemos perceber na carta de Pero Vaz de Caminha: “Parece-me gente de tal inocência que, se nós entendêssemos a sua fala e eles a nossa, seriam logo cristãos, visto que não têm nem entendem crença alguma, segundo as aparências” (2002, p.45).

     Temos como retratação desse exemplo as obras “Expedição aos Martírios” e “Volta à serra misteriosa”,de Francisco Marins. Essas duas obras fazem parte de um triologia que, resumidamente, conta a história de um jovem tropeiro chamado Tonico e seu fiel amigo Perova, personagens brancos, que estão atrás dos tesouros do Martírios e de um tio, que partira há anos em direção a Serra Misteriosa e nunca mais voltara. Em seu percurso, os amigos resgatam o índio Pixuíra de índios rivais. O dois vão em expedição para a Serra dos Martírios, acompanhados voluntariamente pelo índio, lugar que poucos homens encontraram e muitos morreram procurando. Como já conhecia a floresta, o pequeno índio tratava de guiar o grupo entre a mata e saia à procura de alimento para Tonico e Perova, sempre com muita coragem para enfrentar os desafios encontrados na floresta. Os dois meninos admiram a capacidade e o conhecimento do índio diante da selva e seus perigos, e passaram a respeitá-lo mais.
 
     A obra “Volta à Serra Misteriosa” é narrada por Tonico que, anos depois, conta suas memórias e recordações dos anos em que viveu as aventuras ao lado de Perova e Pixuíra.  Juntamente com essas aventuras, são narradas as expedições pelo nordeste e, posteriormente, Oeste. 
 
Durante toda a narração, temos a representação do índio como o bom selvagem passando ao homem branco todo seu conhecimento, sendo sempre prestativo e leal ao europeu (como era característico das narrativas da década de 1960), ficando sempre com a posição de coadjuvante, mas admirado por quem o observa. Francisco Marins retrata características marcantes do bom selvagem ao representar o índio Pixuíra como dócil e completamente dedicado aos brancos, sendo bravo e corajoso – características de heróis românticos. Um trecho que deixa essa representação clara é:
 

O indiozinho, sempre bom camarada, a cada vez que encostávamos as canoas para um pouso, internava-se nos campos e voltava trazendo picuás cheios de deliciosas frutas silvestres, que todos comíamos com grande satisfação: marmelo bravo, mangaba, cajus, guabirobas, etc. (MARINS, 1966, apud BONIN; KIRCHOF, 2012, p. 228).

 

VEJA TAMBÉM:


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Fonte:
BONIN, I. T.; KIRCHOF, E. R. Entre o bom selvagem e o canibal: representações de índio na literatura infantil brasileira em meados do século XX, 2012. Disponível em: http://www.redalyc.org/pdf/894/89425835011.pdf