sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Um dia de cão: latidos e lamúrias em "Os saltimbancos"


Continuando as postagens sobre o musical “Os Saltimbancos”, hoje trataremos da música “Um dia de cão”, da personagem do cachorro, a qual nos remete aos militares, figuras muito presentes no contexto histórico em que a obra foi adaptada à realidade brasileira. Durante o período ditatorial brasileiro os militares formaram a linha de frente na defesa do regime, sendo o soldado aquele que cumpria as ordens de maneira fiel e sem questionamentos, pautado na lealdade e defesa da pátria.

Interessante se faz notar que o texto se inicia com uma frase que pode ser tomada em um sentido denotativo, expressando o dia-a-dia do animal em questão, personagem da peça, como pode ser entendido por um sentido conotativo, remetendo a uma expressão de cunho popular utilizada para se referir a dias tortuosos, complicados, em que nada parece dar certo.

 
Podemos tomar como exemplo do rigor militar e da obediência cega ao regime em vigor, o seguinte no trecho:
 
Lealdade eterna-na
Não fazer baderna-na
Entrar na caserna-na
O rabo entre as pernas-nas

Nesta parte da canção vemos o comportamento ideal de um soldado que: sempre leal não se opor ao regime e obedece sempre. O uso da palavra “caserna” deixa claro que a personagem se refere aos militares, pois “caserna” é o termo utilizado para se referir a uma construção destinada ao alojamento de soldados. “Não fazer baderna” pode remeter a ideia de não se revoltar, não se rebelar, ou manter a ordem vigente. A frase ‘o rabo entre as pernas’ faz remissão a obediência, a impossibilidade de se ter algo diferente do que lhe é imposto, mandado. Ainda, na última estrofe, o cão fala das suas obrigações, como militar, de guardar os interesses do regime:

Fidelidade
À minha farda
Sempre na guarda
Do seu portão

Porém o cachorro apresenta seu descontentamento com a situação da obediência cega e, em um momento de iluminação reflete sobre o seu trabalho e percebe que, na verdade, a única fidelidade que ele tem é a sua necessidade de sobreviver. Assim, termina percebendo a degradação pela qual sua vida vem passando:

Fidelidade
À minha fome
Sempre mordomo
E cada vez mais cão

 
Letra completa da canção:

Um dia de cão

Apanhar a bola-la
Estender a pata-ta
Sempre em equilíbrio-brio
Sempre em exercício-cio
Corre, cão de raça
Corre, cão de caça
Corre, cão chacal
Sim, senhor
Cão policial
Sempre estou
Às ordens, sim, senhor

Bobby, Lulu,
Lulu, Bobby
Snoopy, Rocky
Rex, Rintintin

Lealdade eterna-na
Não fazer baderna-na
Entrar na caserna-na
O rabo entre as pernas-nas
Volta, cão de raça
Volta, cão de caça
Volta, cão chacal
Sim, senhor
Cão policial
Sempre estou
Às ordens, sim, senhor

Bobby, Lulu
Lulu, Bobby
Snoopy, Rocky
Rex, Rintintin
Bobby, Lulu
Lulu, Bobby
Snoopy, Rocky
Estou às ordens
Sempre, sim, senhor

Fidelidade
À minha farda
Sempre na guarda
Do seu portão
Fidelidade
À minha fome

Sempre mordomo
E cada vez mais cão

Segue abaixo o link inerente a música dessa postagem.


2 comentários:

  1. Adorei o blog e todo o conteúdo, entrarei mais vezes.

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  2. Parabéns pela continuação (árdua) do blog, galera do terceiro ano! O conteúdo exposto irá me ajudar muito! Valeu!

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