Alice
começava a sentir-se muito cansada por estar sentada no banco, ao lado da irmã,
e por não ter nada que fazer. Mais do que uma vez espreitara para o livro que a
irmã estava a ler, mas este não tinha gravuras nem conversas... “E para que
serve um livro que não tem gravuras nem conversas?” pensou Alice. (CARROLL,
2000, p.
7)
A
ilustração passou a ganhar maior importância recentemente devido às
transformações midiáticas que têm colocado a imagem em situação de paridade ao
texto. Essas mudanças ocorreram devido
às novas configurações na comunicação visual, por sua vez decorrentes dos meios
informáticos existentes, das possibilidades de criação e da transformação de
imagens, que são cada vez mais complexas e elaboradas.
No
que diz respeito ao âmbito literário, em especial aquele do universo infantojuvenil,
as ilustrações passaram do patamar de importância ao da quase necessidade. Podem
apoiar (afirmar e condizer) o texto verbal (função utilitária), mas possuem função
predominantemente estética. Desta forma, o ilustrador possui o valioso papel de
tornar o texto “mais agradável” do ponto de vista estético, “entrando” na mente
de um leitor-receptor potencial. Este ato problematiza a tarefa do ilustrador,
pois ele precisa encontrar uma linguagem gráfica compatível com aquela desse
receptor potencial. Tal fazer é bastante complicado, já que as crianças, por
exemplo, utilizam muito mais da fantasia do que os adultos e não veem suas
criações artísticas da mesma maneira que os adultos as veem.
Por
tal motivo, observa-se a importância do ilustrador em conhecer os processos
mentais infantis para que ele possa, além de tornar a ilustração atraente a
seus receptores, também agir no desenvolvimento cognitivo e estético perceptivo
de seus receptores.
Tendo isto em
vista, partimos do trabalho realizado por Brisa Caroline Gonçalves Nunes, em
que a estudiosa explora as “ilustrações de livros infantis e seus
atravessamentos pedagógicos, levantando os aspectos com que este tipo de imagem
pode favorecer o desenvolvimento cognitivo e estético perceptivo das crianças” (p. 1).
Além disso, valeu-se do estudo proposto por Marta Morais da Costa a
respeito “do poder de atração que as imagens gravadas na página de um livro representa
para os leitores” (p.24) do universo infantojuvenil.
Como já discutido
em postagens anteriores, o livro literário ilustrado é a união de duas
linguagens, uma verbal e outra visual, que tem função representativa,
informativa e estética. Este diálogo
que ocorre entre esses dois sistemas de signos enriquece o jogo de
significações da leitura feita pelo receptor. No entanto, como afirma Morais da
Costa:
Há, porém, na relação texto-imagem
limites permanentes: nem a palavra consegue substituir a imagem, por mais que
tente descrevê-la, nem a imagem é capaz de reproduzir a sonoridade da palavra e
a multiplicidade de sentidos que ela é capaz de evocar. Mas, respeitando as
respectivas idiossincrasias, texto e imagem podem somar-se e ampliar os
sentidos das mensagens. (p. 25)
Sabe-se assim que
a imagem não pode substituir a palavra e vice-versa, visto que ambos os signos,
em uma obra literária ilustrada, assumem papel igual na transmissão de uma
herança cultural e artística. Esta comunhão da imagem e do texto, além desse
papel, insere o leitor no mundo simbólico e cultural, e é assegurada pela
escola, família e mercado editorial (MORAIS DA COSTA, p. 25). Mas é também esta
influência desses três grupos (família, escola e mercado editorial) que tem intensificado
a associação de palavra e imagem como sendo algo do universo infantil.
Tendo em vista esta
realidade, a leitura infantil tem sido uma combinação do reconhecimento e
aprendizagem desses dois sistemas de signos. O processo de aprendizagem, por
sua vez, é discutido por Nunes em sua abordagem das teorias vigotsquianas em que a
aprendizagem é vista como,
um processo interativo entre o
indivíduo, seus semelhantes, e o meio natural e sócio-cultural em que está
inserido. Entre os postulados básicos, norteadores das pesquisas do autor,
Oliveira afirma: “A relação homem/mundo é uma relação mediada por sistemas
simbólicos.” (OLIVEIRA, 1993, p.23). Tendo o significado de mediação como
“(...) o processo de intervenção de um elemento intermediário numa relação; a
relação deixa, então, de ser direta e passa a ser mediada por esse elemento.”
(Idem, 1993, p. 26). (NUNES, p.3)
Segundo
Vygotsky (1994), existem dois tipos de mediadores que atuam no processo de
aprendizagem infantil: os signos e os instrumentos. Os primeiros concernem à
atuação no campo psicológico, direcionam-se ao pensamento e são orientados
“para dentro do indivíduo”; os segundos, por sua vez, se relacionam a ideia de
trabalho e mediam a relação entre o homem e o mundo. O signo ajudará o
indivíduo nas tarefas que exijam memória, enquanto que o instrumento o
auxiliará no cumprimento dessas tarefas, depois de ter acessado a memória.
No que diz respeito
aos livros infantis, pode-se dizer que estes são os instrumentos e nele se encontram
presente os signos. A manifestação desses signos, como aponta Nunes, ocorre de
duas maneiras: uma através das ilustrações, e outra, através da linguagem verbal.
A partir daí e da ativação da imaginação, a criança, em sua leitura do livro
ilustrado, fará uma mobilização de sentidos para que a narração e o diálogo
entre os dois tipos de signos sejam compreendidos.
Assim, uma criança em processo de
alfabetização, ao ler a palavra “bola” e identificá-la em uma ilustração, não
apenas associa os significados entre uma linguagem e outra (verbal e visual)
reforçando o alfabetismo, como também está compondo um repertório visual, um
conjunto de signos imagéticos que utilizará para executar a função mediadora,
conformizando de fato um processo de aprendizagem. É neste sentido que se
percebe a relevância do papel das ilustrações em livros. (NUNES, p.4)
A ativação dos
mecanismos da imaginação para a criação de novos sentidos a partir do diálogo com as
ilustrações e o texto verbal possibilita à criança desenvolver sua percepção estética. Esta
percepção, como afirma Nunes, “tem uma importância singular na infância,
auxiliando no desenvolvimento de processos cognitivos básicos, necessários para
uma melhor qualidade da vida adulta” (p. 7).
O adulto, por sua
vez, não terá na literatura dedicada a ele a mesma ênfase dada às imagens,
visto que se pressupõe que o processo de aprendizagem da língua já foi adquirido.
O adulto já apresenta os signos
internalizados, ele ainda executa a função mediadora, porém não necessita do
objeto real ou, no exemplo da leitura de um livro, não depende de imagens reais
para compor seu entendimento, pois já realiza o pensamento através de imagens
ou signos internos, como representações mentais. (NUNES, p.4)
Isso
não quer dizer que as ilustrações presente em livros são indiferentes aos
adultos. Como Morais da Costa nos lembra,
Na
perspectiva infantil, um livro sem figuras não tem serventia. Já para os
adultos, um livro com figuras permite redescobrir os sentidos da obra. Seja na
produção para crianças, seja em livros para adultos, não há como negar que a
união entre ilustração e texto tem produzido obras de rara beleza e de
múltiplos sentidos. (p. 24)
Como nos lembra
a Alice de Carroll, as ilustrações conferem um importante prazer na leitura
literária e não devem ficar esquecidas, sejam elas para as crianças no processo
de aprendizado e formação estético perceptiva, seja nas descobertas do adulto
ao ler uma obra literária.
Referências
Bibliográficas
CARROLL, Lewis. Alice no País das Maravilhas.
Publicações Dom Quixote: 2000.
MORAIS DA COSTA, M. Considerações
Iniciais a respeito de texto e imagem no livro de literatura infantil. Revista
Letras, América do Norte, 54, set. 2010. Disponível em:
http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs-2.2.4/index.php/letras/article/view/18668/12128
- Acesso em: 19 Out. 2012.
http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs-2.2.4/index.php/letras/article/view/18668/12128
- Acesso em: 19 Out. 2012.
NUNES, Brisa Caroline Gonçalves. Painel
ilustração do livro infantil: reflexões sobre a importância da imagem no
desenvolvimento estético perceptivo da criança. Disponível em:
http://www.faeb.com.br/livro/Paineis/ilustracao%20do%20livro%20infantil.pdf
- Acesso em: 19 Out. 2012.
http://www.faeb.com.br/livro/Paineis/ilustracao%20do%20livro%20infantil.pdf
- Acesso em: 19 Out. 2012.
VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos
psicológicos superiores. São Paulo: Martins Fontes, 1994.
Grupo 6 : HQs e ilustração do livro infantojuvenil
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