Enredo
Em seu livro “ O grande
pecado de Lampião e sua terrível peleja para entrar no céu”, o autor Joel
Rufino dos Santos apresenta como narrador um cego cantador que conta a peleja
do famoso cangaceiro para entrar no céu.
A história inicia
quando Lampião chega ao céu e se apresenta como o famoso cangaceiro para São
Pedro. Quando o Santo percebe que é Lampião, ele saca um cacete e expulsa o
bandido das portas do céu. Indignado, Lampião saca a peixeira e manda São Pedro
abrir a porta mesmo assim. Diante da situação, os outros santos (que observavam
curiosos a briga) entram para auxiliar o amigo São Pedro. Vendo toda aquela
bagunça, São Jerônimo lança um raio para acabar com a briga e Santa Luzia dá uma
ideia: ela decidiu olhar o livro da verdade, nele está escrito tudo que Lampião
ou qualquer outra pessoa fez de ruim e bom enquanto estava na terra. Se na
página que os santos abrirem estiver algo bom, Lampião entra no céu, se estiver
escrito algo ruim, vai direto para o inferno.
A página que é aberta
conta o dia em que Lampião chega com seu bando na cidade de Cajazeiras. Lá, Lampião conversa com o Padre, que tremia muito, e pede um lugar para
passar a noite. O Padre, com muito medo, arruma um lugar na capela para o bando
passar a noite, porém, fica com medo dos cangaceiros roubarem as imagens de
vários santos que estavam ali. No dia seguinte, o Padre vai ao encontro de
Lampião e seu bando, mas os vê de saída. Com medo de não ter sobrado nada na
capela, o Padre entra rapidamente para verificar e surpreende-se com o que vê:
Lampião deixou um regalo na frente de cada imagem, só não deixou na de São
Benedito.
Convencidos de que Lampião
tinha feito uma boa ação, Santo Antão pede para abrirem a porta do céu. Porém,
São Benedito pergunta o porquê de ser o único que não recebeu uma lembrança na
sua imagem. Visivelmente constrangido, Lampião diz que o motivo foi que não
existe Santo negro. Nesse momento, a revolta dos outros santos foi tamanha, que
começaram a dizer que existem santos de todas as cores e aquilo era um absurdo
de ser dito. No mesmo instante, São Pedro tranca as portas do céu e Lampião é
mandado para o inferno acusado de ser racista.
Questões
Ideológicas
Nota-se que Joel Rufino
dos Santos, autor do livro, trabalha sua história sobre um realismo fantástico,
contando a fábula de Lampião em busca da sua entrada no céu. No entanto, o que
mais nos chama a atenção na obra não é a linguagem, a ilustração ou a cultura
popular, mas a maneira como a temática etnicorracial é apresentada. Na história, o tema racismo é responsável por introduzir "elementos sobrenaturais" (KHÉDE, 1986, p. 21), os santos, ou seja, personagens maravilhosos são usados para retratar um tema polêmico: o racismo.
Conforme a definição, Racismo é uma maneira de discriminar as pessoas baseada em motivos raciais, cor
da pele ou outras características físicas, de tal forma que umas se consideram
superiores as outras. Portanto, o racismo tem como finalidade intencional (ou
como resultado) a diminuição ou a anulação dos direitos humanos das pessoas
discriminadas. Exemplo disto foi o aparecimento do racismo na Europa, no século
XIX, para justificar a superioridade da raça branca sobre o resto da
humanidade.
A discriminação racial é um conceito que normalmente é confundido
com racismo (e que o abarca), mas se trata de conceitos que não necessariamente
coincidem. Enquanto o racismo é uma ideologia baseada na superioridade de uma
raça ou etnia sobre outra, a discriminação racial é um ato que, embora esteja fundado
em uma ideologia racista, nem sempre pressupõe uma superioridade racial. Ou seja, é preciso deixar claro
que a discriminação racial positiva (quando as discriminações têm como objetivo
garantir a igualdade das pessoas afetadas) constitui uma maneira de
discriminação cujo objetivo é combater o racismo.
Historicamente, o racismo tem servido para justificar uma série de genocídios (crimes contra a humanidade) e diversas formas de dominação das pessoas. Exemplo disto foi a escravidão, a servidão, o colonialismo e o imperialismo, dito de outra forma, uma total afronta a dignidade humana básica de diversos povos ao longo do tempo. Com base nessa afirmação, justifica-se a atitude de Lampião ao menosprezar o santo negro, acreditando que santos negros não existem. Atualmente, ações racistas e/ou discriminatórias são consideradas crimes. Notamos, assim, que, a barragem de Lampião na porta do céu, e seu consequente deslocamento para o inferno, é uma forma de punição por sua atitude racista; apesar de cometer vários crimes, ele é punido rigorosamente por ter sido racista.
Historicamente, o racismo tem servido para justificar uma série de genocídios (crimes contra a humanidade) e diversas formas de dominação das pessoas. Exemplo disto foi a escravidão, a servidão, o colonialismo e o imperialismo, dito de outra forma, uma total afronta a dignidade humana básica de diversos povos ao longo do tempo. Com base nessa afirmação, justifica-se a atitude de Lampião ao menosprezar o santo negro, acreditando que santos negros não existem. Atualmente, ações racistas e/ou discriminatórias são consideradas crimes. Notamos, assim, que, a barragem de Lampião na porta do céu, e seu consequente deslocamento para o inferno, é uma forma de punição por sua atitude racista; apesar de cometer vários crimes, ele é punido rigorosamente por ter sido racista.
Nas últimas semanas, o problema
da discriminação racial está sendo amplamente discutido na mídia devido à
repercussão de “Negrinha”, livro de Monteiro Lobato, que trouxe à tona este
assunto tão polêmico. Não foi diferente no ano passado, quando o livro “Caçadas
de Pedrinho”, também de Lobato, criou uma dúvida/questionamento sobre até que
ponto indícios de discriminação racial, ou qualquer outro tema politicamente
delicado pode fazer parte de um livro de literatura infanto-juvenil.
A escolha do livro de Joel Rufino
dos Santos foi para refletirmos, com mais precisão, sobre o racismo e
a discriminação racial (já teorizados anteriormente no texto). O tema central da
obra é a discriminação racial, visto que o destino de Lampião em ser mandado
para o inferno resulta dessa temática, como já mencionado. Vale ressaltar que a obra apresenta diversos temas polêmicos (dentre eles: assassinato, religião, etc.), mas optamos aqui por fazer um recorte e destacar apenas as questões raciais.
Percebemos que o livro transmite
ao leitor uma lição de moral e mostra, por meio de um cangaceiro, visto como
bandido e homem sem piedade nem honra, que atitudes preconceituosas são
repudiadas em qualquer situação da vida e, mesmo depois da morte, terão consequências para a pessoa que agir dessa forma, pois no caso de Lampião, foi mandado
para o inferno.
Considerações Finais
O leitor tem em mãos um livro
divertido, mas que lhe garante uma problemática presente em seu cotidiano. O
contexto em que ele vive e a situação que ele encontra no livro o fazem
questionar – seja uma criança ou adulto – e julgar como, em pleno século XXI,
ainda presenciamos situações como a sofrida por São Benedito. Porém, deixa
claro que a atitude do personagem é extremamente incorreta. Segundo Perrotti,
:
(...) a literatura para crianças [buscou] inicialmente inspiração
na literatura oral e não na tradição literária Greco-latina, a atitude social
de transformar esta última em utilidade, ao diluir o estético, é já corrente na
Contra-Reforma e define o entendimento que a burguesia teria do que deva ser
uma literatura para o público infanto-juvenil em vias de formação. O discurso
utilitário está instituído como modelo dominante, desde essa época, como deixa claro Soriano ao dizer que “os critérios dominantes
no setor da literatura para crianças desde a Contra-Reforma giram em torno da
noção de ‘moralidade’, rubrica geral que reúne alguns imperativos referentes às
‘boas maneiras’ e de um modo ainda mais rigoroso, o pudor. E um outro critério,
este, político, não é menos importante. As obras destinadas à juventude não
devem jamais colocar em questão a ordem estabelecida. (PERROTTI, 1986).
Assim, a obra de Joel Rufino dos
Santos é utilitária, pois apresenta criticamente temáticas sociais, sem fugir do que realmente tem de ser feito,
repudiar a atitude racista.
Referências
KHÉDE, S. S. Personagens da literatura infanto-juvenil. São Paulo: Ática, 1986.
KHÉDE, S. S. Personagens da literatura infanto-juvenil. São Paulo: Ática, 1986.
PERROTTI, E. O texto sedutor
na literatura infantil. São Paulo: Ícone, 1986.
Acessado em 08/10/2012 http://www.infoescola.com/sociologia/racismo/
GT3
- Literatura e Ideologia
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