Em vias gerais, todo ciclo tem seu começo e seu fim, dando espaço a outro que venha lhe ocupar o lugar, exceto em raros e bons casos cujo percurso se faz infinito pelo saber dos ventos e dos tempos. Sem fugir a regra, encerramos com essa postagem um ciclo* destinado a trazer nossas considerações a respeito da obra Os Saltimbancos, versão de Chico Buarque da consagrada montagem Os músicos de Bremmen, dos irmãos Grimm, tingidas sobre as cores de um passado cinzento que cobriu o céus de nossa nação, ganhando nas entrelinhas a crítica sublime de quem reprova e age com as armas que lhe são inerentes: as palavras. Ressaltamos aqui, que apesar do número de postagens dedicadas ao tema e do trabalho que se empreendeu (cuidadoso com as análises alegóricas, trechos e sentidos), não tivemos a pretensão de esgotar as possibilidades de leitura, de abordagem e de estudo, visto que a obra por si só tem como aspecto positivo estar aberta a interpretações, sendo atualizada cada vez que se aponta novo norte de interesses e curiosidades.
De acordo com Rufino
(2008), durante o período ditatorial brasileiro, todo tipo de produção cultural
(jornais, teatro, música, cinema etc.) foi influenciada pela situação
sociopolítica do país, já que após os atos institucionais I, II e III, as atividades culturais
ganharam grande função política como local de possíveis discussões e
resistência à ditadura, devido ao seu caráter de formadoras de opinião e
comportamento. Assim, os artistas, somados aos estudantes e intelectuais,
sentiram a pressão do governo que tentou calar quem tinha algo a falar.
Segundo o site Virtuália –
O Manifesto Digital,
Chico
Buarque foi um dos compositores mais censurados durante a ditadura. Tanto as
canções de protesto quanto as que se referiam aos costumes da época sofreram
com a censura.
Os problemas de Chico Buarque com a censura
começaram junto com a sua carreira. Em 1966, a música “Tamandaré”,
incluída no repertório do show “Meu Refrão”, com Odete Lara e MPB-4, é
proibida após seis meses em cartaz, por conter frases consideradas ofensivas ao
patrono da marinha. Era o começo de um longo namoro entre a censura e a obra de
Chico Buarque.
No período tornou-se comum
a estratégia de compositores utilizarem muitos discursos metafóricos para
burlar a censura (como por exemplo, os animais das canções já descritas que
poderiam, se compreendidaos como alegorias, representar vários tipos humanos). Rufino (2008) ressalta que uma frase muito
difundida no meio artístico era: “Silêncio ou metáfora”, e que as ações de cantar e gritar, nas músicas da gata e
do jumento, “funcionam como metáforas para a resistência” e para a rebeldia.
Ambos se rebelaram contra seus donos na fábula quando decidiram abandoná-los e
seguir para a cidade, do mesmo modo se rebelaram por meio da música (a gata
cantando e o jumento berrando). Rufino (2008) faz uma leitura de que os dois
animais são tomados metaforicamente como o “povo” e seus senhores como o governo
ditatorial (isso foi muito abordado na análise das quatro canções dos animais
principais da peça).
Em seu estudo, Rufino
(2008) aponta que as canções História de
uma Gata e O Jumento enquadram-se em um paradigma de produção que buscava burlar “a censura e as
leituras feitas pelos órgãos governamentais”. As canções, avaliando todas da
peça Os Saltimbancos como um geral,
possuem
um público bem específico (infantil) a ser persuadido. Para alcançar seu
objetivo, o enunciador se desdobra com esmero para conquistar o enunciatário,
que, como vimos, tornou-se um leitor que espera ser surpreendido a todo
momento. As estratégias de persuasão que foram evidenciadas em nossa análise
possuem como traço característico o aspecto lúdico. Elas interpelam a criança,
colocando-a sempre numa situação de estranhamento (Rufino, 2008, p.124).
Assim,
as letras das canções da peça Os
Saltimbancos, utilizando-se da figuração, pretendiam conquistar os públicos
adulto e infantil mostrando-lhes que a rebeldia era possível e necessária, o que era exemplificado (ou melhor, sugerido alegoricamente) pelos animais deixando seus donos, se livrando da submissão e da exploração.
* Link para as outras análises das canções de Os saltimbancos:
1. Teatro, música e poesia: Os saltimbancos, de Chico Buarque
2. Um dia de cão: latidos e lamúrias em Os saltimbancos
3. A galnha de Os saltimbancos: uma análise marxista
4. Acomodação e consciência: faces de um mesmo jumento em Os saltimbancos, de Chico Buarque
* Link para as outras análises das canções de Os saltimbancos:
1. Teatro, música e poesia: Os saltimbancos, de Chico Buarque
2. Um dia de cão: latidos e lamúrias em Os saltimbancos
3. A galnha de Os saltimbancos: uma análise marxista
4. Acomodação e consciência: faces de um mesmo jumento em Os saltimbancos, de Chico Buarque
Referências
RUFINO, Janaína de Assis.
Entre homens e animais: análise semiótica de letras de canções infantis. In: Mal-Estar e Sociedade.
Ano 1, v. 1, n. 1. -- Barbacena,
MG : EdUEMG, 2008.
Site Virtuália. URL: http://virtualiaomanifesto.blogspot.com.br/2008/07/msica-e-censura-da-ditadura-militar.html
Site Virtuália. URL: http://virtualiaomanifesto.blogspot.com.br/2008/07/msica-e-censura-da-ditadura-militar.html
GT4 - Teatro e música infanto-juvenil
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