sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Ana Maria Machado- Parte II - História meio ao contrário

HISTÓRIA MEIO AO CONTRÁRIO


           Assim que lemos o título do livro História meio ao contrário, lançado em 1978 por Ana Maria Machado, percebemos que não se trata de uma história convencional. As “histórias podem ir em uma direção, digamos, direto ou na contramão [...]. Meio ao contrário soa esquisito, porque não se compromete com um lado, nem com outro, contradizendo pois, qualquer uma das maneiras a que se está acostumado” (ZILBERMAN, 2004, p. 53).

Esta ruptura se expande cada vê mais ao passo que fazemos a leitura da história. Logo na primeira linha encontramos a frase “e viveram felizes para sempre”, normalmente encontrada no fim das narrativas.

Esta é a História meio ao contrário de Ana Maria Machado. Inovadora, contestadora, procurando a cada página abrir os olhos de seus leitores mirins para a realidade de um Brasil que vivia um sistema político ditatório, portanto, autoritário e fechado a liberdade de expressão. Devemos lembrar que essas crianças seriam futuros cidadãos brasileiros. Além disso, o livro circularia em suas casas, onde os pais também poderiam lê-los, passando, dessa forma, de mão em mão uma ideologia mais libertária “estimulando a busca de uma existência independente, do ponto de vista pessoal, e o desagrado perante o sistema político autoritário e distanciado da população” (ZILBERMAN, 2004, p.54).

Embora Ana Maria Machado tenha escolhido um cenário muito próximo dos contos de fadas, um ambiente feudal com direito a rei, princesas, dragões e outros personagens comuns a literatura infantil dos séculos XVIII e XIX, ela rompe com a forma e o conteúdo escolhidos por autores como Perrault e os irmãos Grimm.

O narrador, normalmente neutro nos contos infantis, aqui aparece intruso; conversa com seu leitor – “Eles explicaram. Eu não vou explicar aqui tudo de novo, porque todos nós já sabemos” (p. 28) –  tornando a leitura e o narrador mais próximos do interlocutor.

Mas as maiores marcas de mobilização em busca de um futuro melhor estão na personalidade dos personagens.

O rei, autoridade máxima do reino, é alienado, ignorante e desconhecedor das necessidades do seu povo, da mesma forma que os políticos ditadores brasileiros.

Contra os desmandos que iriam prejudicar as suas vidas, os súditos, povo trabalhador, se une, procura o sábio gigante e consegue, por meio de sua inteligência e união, enfrentar o rei e fazê-lo desistir de uma atitude tão errada e injusta.

Neste círculo se encontra a camponesa, mulher guerreira e inteligente, que mesmo sendo uma pessoa simples consegue conquistar o príncipe prometido à princesa. Esta, por sua vez, invés de casar com o seu prometido, prefere enfrentar o pai e viajar pelo mundo, vivenciando experiências não possíveis naquele lugar.

Como nos lembra Zilberman, a contestação está presente em vários pontos da história: “ao denunciar o alheamento dos responsáveis do poder, que ignoram o que se passa fora do castelo, seja o ritmo da natureza, seja as necessidades da população; e ao sugerir às pessoas, mesmo muito jovens, como os leitores de História Meio ao Contrário, seguirem o que manda o coração ou a inteligência, não, porém, obrigações ou mandados de fora” (2004, p. 53-54).

Esta é a literatura infantil brasileira pós anos 70 que busca levar seus leitores à reflexão e a luta por seus direitos, unindo duas funções da literatura: a estética e a instrumental/utilitária.
 

REFERÊNCIAS

ZILBERMAN, Regina. Como e por que ler a literatura infantil brasileira. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004, p. 52-55.

PONDÉ, Glória. A arte de fazer artes: como escrever histórias para crianças e adolescentes. Rio de Janeiro: Nórdica, 1985, p. 91-116.


Grupo 6: Autores Consagrados da Literatura Infanto-Juvenil

2 comentários:

  1. Boa postagem. Apresenta resenha crítica da lavra do próprio grupo de trabalho, embora pudesse aproveitar melhor a análise e discussão feitas em classe. (Marciano Lopes)

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