Sim, esse título
lembra um outro livro de uma escritora brasileira muito conhecida,
Perto do Coração Selvagem, que foi o primeiro livro escrito por
Clarice Lispector. A autora ficou muito famosa por diversos livros
que todos conhecem: Água Viva, A Paixão Segundo GH, A Aprendizagem
ou o Livro dos Prazeres, Laços de Família, entre outros. E por
incrível que pareça, escreveu também Literatura Infantil:
- Mistério do Coelho Pensante, 1967
- A Vida Íntima de Laura, 1974.
- A Mulher que Matou os Peixes, 1969.
- Quase de Verdade, 1978.
Quem
já leu alguma obra da autora, como Água Viva, se impressiona ao
descobrir que ela escreve livros para crianças, fica imaginando como
será a narrativa. E irá se surpreender muito mais ao começar a
leitura, pois Clarice escreve de maneira quase maternal, de forma a
tentar envolver o pequeno leitor, sempre com muito carinho, como se
estivessem ao seu lado, com o objetivo de criar intimidade, ganhar
confiança dos pequenos. Podemos notar isso claramente em alguns
trechos de A Mulher que Matou os Peixes:
“Antes de começar, quero que
vocês saibam que meu nome é Clarice. E vocês, como se chamam?
Digam baixinho o nome de vocês e meu coração vai ouvir.”
Cria,
também, um clima de aconchego e conforto:
“Sabem de uma coisa? Resolvi
agora mesmo convidar meninos e meninas para me visitarem em casa. Vou
ficar tão feliz que darei a cada criança uma fatia de bolo, uma
bebida bem gostosa, e um beijo na testa.”
Em
todas as obras, ela começa a narrativa aos pouquinhos, e não deixa
de fazer intervenções ao longo do livro, sempre dialogando com o
leitor, firmando a intimidade, e fazendo com que o leitor fique
completamente envolvido, característica, também, muito comum em sua
obra voltada para os adultos. A linguagem é simples, muito próxima à
da criança. A obra é ainda recheada de onomatopeias, metáforas,
aliterações, repetições, e outros recursos estilísticos.
Em
O Mistério do Coelho Pensante, Joãozinho, é um coelho que
pensa e tem ideias brilhantes e que ninguém sabe de onde vêm e,
por isso, permanecem os “mistérios” do começo ao fim do livro.
“Coelho é como passarinho: se assusta com carinho forte demais, fica sem saber se é por amor ou por raiva. A gente tem que ir devagar para ele ir se acostumando, até que ele ganha confiança.”
Laura, uma galinha de “A Vida Íntima de Laura”, também pensa.
Apesar de “burrinha”, tem “pensamentozinhos e
sentimentozinhos”, e até cacareja assim: “Não me matem! Não me
matem!”
“Agora adivinhem quem é Laura.
Dou-lhe um beijo na testa se
adivinhar.”
“Laura, toda satisfeita,
esfregou suas penas com o bico para alisar – igual como a gente
penteia os cabelos. Porque ela é muito vaidosa e gosta de estar bem
arrumada.”
Ulisses de Quase de Verdade é o cachorro que “poupa” o trabalho de Clarice ao contar a história, ou melhor, de ser o narrador.
Interessante assistir à entrevista da autora, concedida ao jornalista Junio Lerner, na TV Cultura, em 1977, Clarice Lispector fala, entre outras coisas, sobre sua produção literária para crianças.
Temos
aqui, a parte referida transcrita:
JL
: Como você explica a Clarice Lispector voltada para a literatura
infantil?
CL:
Começou com meu filho quando ele tinha seis anos, seis ou cinco
anos, me ordenando que escrevesse uma história para ele. E eu
escrevi. Depois guardei e nunca mais liguei. Até que me pediram um
livro infantil. Eu disse que não tinha. Eu tinha inteiramente
esquecido daquilo. Era tão pouco literatura para mim, eu não queria
usar isso para publicar. Era para o meu filho. Aí lembrei: "Bom,
tenho, sim”. Então foi publicado. Foram publicados três livros de
literatura infantil e estou fazendo o quarto agora.
JL:
É mais difícil você se comunicar com o adulto ou com a criança?
CL:
Quando me comunico com criança é fácil porque sou muito maternal.
Quando me comunico com o adulto, na verdade, estou me comunicando com
o mais secreto de mim mesma.
JL:
O adulto é sempre solitário?
CL:
O adulto é triste e solitário.
JL:
E a criança?
CL:
A criança tem a fantasia solta.
Clarice
é uma escritora fascinante, misteriosa e considerada pela maioria de
escrita difícil e densa, mas que instiga todos a lerem. E agora,
quem não ficou com vontade de voltar a ser criança lendo as obras
infantis?
Para finalizar este post, é necessário explicar um pouco a nossa temática. Antes, o tema era Autores Consagrados. Modificamos um pouco este tema, com consenso do professor. Falaremos de autores consagrados sim, mas que foram conhecidos pela Literatura Universal, e não pela infantil, como mostramos nessa postagem. Vale ler um texto que a equipe do ano passado fez: O Que Faz Um Escritor Ser Consagrado?
Outro ponto a ser considerado, é o titulo da postagem, Perto do Coração Criança, é uma obra publicada pela EDUEL (Universidade Estadual de Londrina), pelo autor Nilson Dinis, que retrata e analisa a literatura infantil de Clarice Lispector. O download da obra pode ser feito, em pdf, neste site.
GRUPO 2 : Autores consagrados
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